Roteiro Homilético 4: Dom Henrique
O Evangelho
que escutamos neste Domingo é parte do capítulo décimo do Evangelho de São
Mateus, que traz o Discurso Apostólico de Jesus: aí, ele chama os Doze – como
ouvimos no Domingo passado, previne seus discípulos para as incompreensões e
perseguições que sofrerão, exorta-os a não terem medo de falar, afirma
claramente que ele mesmo, Cristo, é causa de divisão e, finalmente, renova o
convite para segui-lo. Então, estejamos atentos, pois o Senhor nos está falando
dos desafios próprios da missão de ser cristão, ontem como hoje!
Claramente,
ele nos previne sobre as dificuldades e perseguições: “Não existe discípulo
superior ao mestre, nem servo superior ao seu Senhor. Se chamaram Beelzebu ao
chefe da casa, quanto mais chamarão assim seus familiares” (Mt 10,24s). Estamos
vivendo hoje, neste início de terceiro milênio, a verdade dessas palavras de
Jesus. Basta que recordemos as terríveis censuras à Igreja por suas posições o
campo da moral sexual e da bioética. Num mundo que não aceita mais Deus e a
religião – a não ser no âmbito da vida privada, sem nenhuma importância para a
sociedade, anunciar o Cristo e suas exigências virou um crime insuportável para
a sociedade neo-pagã! E, no entanto, a ordem que o Senhor nos dá é clara: “O
que vos digo na escuridão, dizei-o à luz do dia; o que escutais ao pé do
ouvido, proclamai-o sobre os telhados!” A Igreja e cada cristão não podemos
calar a novidade e a vida que encontramos em Cristo, não podemos passar por
alto as exigências do amor ao Senhor! E o sofrimento? E as incompreensões?
Fazem parte do anúncio do Evangelho. São Paulo claramente afirmava aos Gálatas:
“Se eu quisesse agradar agradar aos homens não seria servo de Cristo” (1,10).
Seria trair o nosso Senhor esconder, mascarar as exigências do Evangelho em
nome de um falso diálogo com o mundo, de uma falsa misericórdia e de uma falsa
compreensão do homem de hoje. Somente Cristo liberta de verdade o ser humano –
o Cristo inteiro, pregado integralmente, com todas as conseqüências do seu
Evangelho! Qualquer um que deseje fiel a Deus experimentará a incompreensão e a
solidão. Recordemos, na primeira leitura, a queixa do Profeta Jeremias, as
calúnias por ele sofridas. Ora, a Igreja não pode fugir desse destino; o
cristão – eu, você – não podemos fugir desse compromisso com Cristo! Aliás, o
século XX, apenas terminado, foi o século que mais matou cristãos, que mais os
perseguiu e exterminou. Só que os meios de comunicação e os governos
politicamente corretos mudam e disfarçam a expressão “perseguição religiosa”
com a mentira açucarada chamada “choque de culturas”. Não! É perseguição por
causa do Evangelho, perseguição por amor a Cristo, perseguição que gera
mártires! Também nós, estejamos prontos e nos acostumemos aos ataques contra a
Igreja, que visam desmoralizar o cristianismo: na imprensa, muitas vezes, nas
universidades, na opinião pública em geral…
Como responder
a essa dolorosa realidade? Certamente, com uma atitude de fé, colocando-se nas
mãos do Senhor, como Jesus colocou-se nas mãos do Pai: “Ó Senhor, que provas o
homem justo e vês os sentimentos do coração… eu te declarei a minha causa!” Não
irá se sustentar na fé quem não cravar os olhos e o coração no Senhor
crucificado por nós, quem não estiver disposto a participar do mistério de sua
cruz! As perseguições de hoje dão-nos a chance de testemunhar nosso amor ao
Senhor e escutar aquelas comoventes palavras suas aos discípulos: “Fostes vós
que permanecestes comigo em todas as minhas tentações” (Lc 22,31). O que não
podemos, caríssimos, é nos acovardar, negociar com um mundo que refuta Jesus:
“Todo aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante do meu
Pai que está nos céus!” Também não podemos pagar o mal com o mal, violência com
violência, calúnia com calúnia, mentira com mentira! Não devemos nunca nos
deixar vencer pelo mal: “Cristo sofreu por vós, deixando-vos um exemplo, a fim
de que sigais seus passos. Quando injuriado, não revidava; ao sofrer, não
ameaçava; antes, punha a sua causa nas mãos daquele que julga com justiça” (1Pd
1,21.23). A Igreja – e nós somos Igreja – não deve se calar ante os inimigos do
Evangelho. Com paciência, firmeza, coragem e amor à verdade deve fazer ouvir
sua voz, quer agrada quer desagrade, quer aceitem quer não!
Mas – pode
alguém perguntar -, por que essas dificuldades? Por que a rejeição ao anúncio
do Evangelho? Todos ouvimos São Paulo falar hoje, na segunda leitura, do
mistério do pecado: “O pecado entrou no mundo por um só homem. Através do
pecado, entrou a morte”. O Apóstolo quer dizer que toda a humanidade
encontra-se numa situação de fechamento em relação ao Deus da vida,
encontra-se, portanto, numa situação de morte! “Todos pecaram!” – quão triste é
a condição do coração humano; quão triste, a situação do mundo! Pecaram os
judeus, desobedecendo os preceitos da Lei; pecaram os pagãos, mesmo sem terem
conhecido um preceito como aquele dado a Adão ou os preceitos da Lei de Moisés!
Pecamos e embotou-se o nosso entendimento, a nossa sensibilidade para as coisas
de Deus! O Senhor, tanta vez, parece-nos pesado demais; as exigências do seu
amor, às vezes parecem nos oprimir. É que somos egoístas, somos fechados sobre
nós mesmos! Por isso, a primeira palavra de Jesus é “convertei-vos”!
E, no entanto,
ainda que dirigido a um mundo fechado no seu pecado e na sua prepotência, o
anúncio de Cristo é anúncio de uma maravilhosa novidade para a humanidade: se
nos primeiros homens, iniciou-se uma corrente maldita, uma cadeia de pecado, em
Cristo, o novo Adão, iniciou-se a possibilidade de uma humanidade nova: “A
transgressão de um só levou a multidão humana à morte, mas foi de modo bem
superior que a graça de Deus, ou seja, o dom gratuito concedido através de um
só homem, Jesus Cristo, se derramou em abundância sobre todos”. Eis! Ainda que
incompreendida, o anúncio que a Igreja faz é de vida e salvação para toda a
humanidade! O cristianismo não é negativo, nunca dirá que o mundo está perdido,
que as coisas não têm jeito! É verdade que o mundo crucificou o Senhor Jesus –
e nos crucifica com ele; mas também é verdade que o Senhor ressuscitou, venceu
para a vida do mundo e estará sempre presente conosco!
Caríssimos,
vivamos com coerência, com coragem, com amor a nossa fé! Não tenhamos medo, não
desanimemos, não vivamos como os que não conhecem a Cristo! Não nos fechemos em
nós mesmos! De esperança em esperança, vivamos e anunciemos o Senhor, certos de
sua presença e de seu amor. Ele jamais nos deixará! A ele a glória para sempre.
Amém.